Ricardo Carneiro | Le Monde Diplomatique

 

Num recente debate sobre a política monetária brasileira promovido pelo Tribunal de Contas da União, o economista Affonso Celso Pastore, além de várias afirmações discutíveis, compartilhadas pela ortodoxia, saiu-se com a seguinte falácia: seria um absurdo fazer um Quantative Easing (QE) no Brasil com o objetivo de controlar, mesmo que temporariamente, as taxas longas de juros. Nos países desenvolvidos, sobretudo nos Estados Unidos, o fato das taxas de juros serem muito baixas faria com que a distorção introduzida pelo QE não fosse relevante. Seria apenas mais um recurso para administração da liquidez. Sem dúvida, uma afirmação heroica diante da magnitude da emissão monetária feita pelo Federal Reserve (Fed), para comprar títulos públicos e privados com o objetivo de controlar a taxa de juros longa. Assim, a magnitude, extensão e duração do programa, não deixam dúvidas sobre o seu significado. Em 2008, imediatamente antes da falência do Lehman Brothers, os ativos do Fed, montavam US$ 900 bilhões. As várias etapas do programa levaram o valor dos seus ativos para cerca de US$ 4,1 trilhões dos quais 3,8 trilhões em títulos, ao final de 2019, antes da pandemia. Ou seja, a ampliação foi de cerca de 5%, para 25% do PIB.

Dentre as proposições falaciosas na análise do economista, ressalta-se a explicação para a baixa taxa de juros nos Estados Unidos. Esta seria produto da estrutura etária da população e do ciclo de vida: em curtas palavras, uma sociedade envelhecida poupa mais, o que pressionaria a taxa de juros para baixo. Afora o fato de ter ignorado inteiramente a teoria keynesiana de determinação da taxa de juros, fundada na preferência pela liquidez dos detentores de riqueza e na oferta de moeda da autoridade monetária, e voltar para velha e imprestável teoria dos fundos emprestáveis, recuando um século na teoria econômica, a tese ignora os fatos de maneira radical. A evidência inegável é que diante da crise financeira e do brusco deslocamento da preferência por liquidez, inclusive com um sell-off de títulos nos mercados secundários, não fora as compras do Fed, as taxas de juros longas teriam explodido. Argumentar que esta foi apenas uma intervenção de liquidez significa ignorar que o programa já dura mais de uma década.

 

Leia o artigo completo aqui: https://diplomatique.org.br/as-falacias-do-dr-pastore-2/