Carlos Drummond | Da Carta Capital

Naquilo que depender do ministro Paulo Guedes, a vulnerabilidade externa, pesadelo da economia nos anos 1980 e 1990, talvez volte a abalar o País antes do que se imagina, alertam vários economistas. Não satisfeito em torrar empresas e outros bens e recursos nacionais para pagar juros da dívida pública, o Ministério da Economia acelera, com a mesma finalidade, a venda de reservas cambiais. Além disso, prepara a abertura de contas bancárias em dólar no Brasil e pretende promover um rebaixamento unilateral de tarifas de importação. Combinadas, essas iniciativas têm força suficiente para encaminhar a médio ou longo prazo uma crise cambial, principalmente em um contexto de crise externa, advertem muitos analistas.

A queima de reservas por Guedes, que criticou o seu “excesso” durante a campanha eleitoral, acelerou. “O Banco Central vendeu mais de 25 bilhões de dólares em outubro e novembro. A estratégia vai em linha com a redução do papel do Estado e de seus instrumentos de atuação na economia. A continuidade dessa política pode fragilizar as nossas proteções contra choques externos”, alerta o economista Pedro Rossi, da Unicamp, especialista na área cambial. Em agosto, quando o governo anunciou a primeira venda, as reservas somavam 388 bilhões de dólares. A aceleração da queima de divisas para pagar juros, diz Rossi, “representa uma sinalização perigosa, dependendo de até onde vai essa política. A história ensina que os países que fazem uma ampla abertura financeira devem ter capacidade de enfrentar ataques especulativos e fuga de capitais. As crises cambiais da globalização mostram isso, como no caso do México em 1994, da Ásia em 1997, da Rússia em 1998, do Brasil em 1999 e da Argentina em 2001”.

Há neste governo “total falta de noção sobre como funcionam a economia brasileira e as economias emergentes em geral. O Brasil tem um histórico de crises ligadas à questão externa e, em todas elas, exceto na de 2015, a ausência de reservas tornava o País mais vulnerável”, chama atenção a economista Esther Dweck, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Do ponto de vista de uma economia que tem fluxo de capital, prossegue, “o volume de reservas acaba sendo um colchão importante para fazer frente quando há uma reversão, com saída de capital”, sublinha a professora.

Ao que tudo indica, o Ministério da Economia não reconhece “uma diferença importante e qualitativa entre as moedas centrais, que exercem as funções clássicas da moeda em âmbito internacional, a exemplo do dólar, e as moedas periféricas, que não são moedas em âmbito internacional, ou seja, não exercem as funções da moeda nesse âmbito, como o real”, sublinha Bruno De Conti, professor da Unicamp.

A vulnerabilidade externa da economia brasileira diminuiu comparativamente à situação do início do século em razão da redução da dívida externa e, assim, do descasamento de moeda, destaca a economista Daniela Magalhães Prates, professora do Instituto de Economia da Unicamp. “A maior redução ocorreu na dívida externa pública, com a recompra dos títulos Brady no primeiro governo Lula. Tal redução, ao lado do acúmulo de reservas internacionais, tornou o setor público brasileiro credor em moeda estrangeira, o que possibilitou a adoção de políticas contracíclicas em resposta ao efeito-contágio da crise financeira global de 2008, pois a depreciação do real teve impacto positivo sobre a situação fiscal. Mas a economia brasileira tem déficit em conta corrente e, desse modo, continua dependente da absorção de recursos externos”, chama atenção a professora da Unicamp.

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