MÍDIA

 

Edda Ribeiro | Isto É

 

O ano começou com a terceira gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cheia de críticas, expectativas e dúvidas sobre a herança deixada pelo ex-presidente da República Jair Bolsonaro. Para espanto de alguns – principalmente do mercado financeiro – a inflação, que terminou em 5,79% em 2022, fechou melhor, contra os atuais 4,68% no acumulado dos últimos 12 meses, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Outro horizonte positivo, também relacionado com a queda do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), foi a trajetória de queda da Selic, taxa básica de juros, que começou 2023 num embate político entre Lula e Roberto Campos Neto, do Banco Central, e fechou em 11,75% ao ano. É o menor patamar do índice desde maio de 2022.

Retrospectiva econômica: entenda como juros, inflação, PIB e medidas do governo se relacionaram para fechar 2023.

Três temas são conectados ao cenário de juros, com queda favorável, mas que começou de forma tardia, tendo um banco central mais conservador e defensor da máxima ‘conter a inflação para baixar os juros’. Marco Rocha, economista e professor do Instituto de Economia da Unicamp, enumera alguns pontos:

“Primeiro foi o espaço aberto pela redução no começo do ano da taxa de juros norte-americana e a redução também da inflação global depois do pior momento do pico e do preço da energia por conta do conflito da Ucrânia. Os preços de energia e dos alimentos também começaram a ceder um pouco. A inflação internacional passou pelo mesmo processo, isso permitiu, de certa forma, abrir espaço também para a redução da taxa de juros no Brasil”, afirma.
O comportamento da balança comercial também foi favorecida pelo comportamento de preço tanto do agro quanto a indústria extrativa foi mais um desses componentes que repercutiu positivamente na formação do PIB, criando também maior horizonte de certeza sobre o comportamento da taxa de câmbio e dos juros futuros.

Para além disso, tem o comportamento dos preços internos. “O Brasil teve uma safra de alimentos muito boa, o que significou menores pressões sobre o item Alimentação nos índices de inflação, e isso também possibilitou uma redução da taxa de juros, lembrando que o item Alimentos foi um dos fatores que pressionaram as inflações em anos anteriores”, defende Rocha.

 

Dólar abaixo de R$ 5

Para melhorar, o tão criticado dólar também se movimentou em consequência aos pontos acima. Na reta final de 2023, a moeda segue performando diferente das expectativas do mercado há 11 meses, quando o Boletim Focus anunciava projeção do câmbio na casa dos R$ 5,30. Na primeira quinzena de dezembro, a pesquisa do Relatório de Mercado mostrou que a expectativa é outra: o câmbio em 2023 passou para R$ 4,95 e em 2024, para R$ 5.

“Tudo isso contribuiu, de certa forma, para a redução da taxa de juros e também para a redução do câmbio; no fundo, o comportamento da economia norte-americana e a acomodação de certas tensões globais também possibilitaram dólar um tanto mais barato, o que contribui, por sua vez, também para os itens em que o dólar repercute dentro do índice de inflação”, esclarece o economista.

 

Arcabouço e metas

Ao mesmo tempo, a atual equipe econômica travou embates no Congresso Nacional para aprovar duas propostas essenciais para o país: o arcabouço fiscal, que substitui o antigo teto de gastos; e a reforma tributária, discutida há pelo menos 30 anos, e que simplifica impostos sobre o consumo.

Para Rocha, a grande vitória do governo Lula 3 até agora foi a PEC da Transição, responsável por bancar programas sociais prioritários, como o Bolsa Família, Farmácia Popular, entre outros. Também é responsável pelo cenário econômico, segundo especialista.

“Ela está garantindo, de certa forma, um bom crescimento esse ano, além do comportamento das exportações, de forma geral, mas ela que está acomodando uma série de políticas que estão permitindo uma certa ao governo realizar certas medidas que, no final das contas, estão contribuindo também para um resultado positivo acima do esperado na economia”, explica.
A nova regra, promulgada em agosto, autoriza o aumento de despesas acima da inflação, diferentemente do teto de gastos. Com ela, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deu start para a busca pelo déficit zero nas contas do governo de olho em 2024. A medida também era uma ‘demanda para acalmar o mercado’.

 

“O novo arcabouço fiscal tem o mérito de colocar um horizonte de segurança sobre o comportamento da dívida e das contas públicas, que era uma demanda sobretudo do mercado financeiro, e com isso o governo conseguiu criar um horizonte, vamos dizer assim, de negociação com esse setor e de uma certa boa vontade, que acabou tendo repercussão nas taxas de juros de longo prazo”, diz Rocha.

Para ele, no entanto, o arcabouço é pouco anticíclico. “Quando a economia está crescendo, o governo consegue acomodar gastos, consegue recuperar a sua capacidade de realizar política; com a economia entrando em estagnação ou entrando em crise, a capacidade fiscal de fazer políticas contra a crise e contra a estagnação econômica, por conta da própria forma que funciona o novo arcabouço, fica também um tanto prejudicada. O limite mínimo de despesas, pelo menos na minha leitura, é muito pouco, no caso, por exemplo, de uma crise ou de um processo de estagnação. E aí acaba a capacidade da política fiscal agindo nesses momentos também ficando prejudicada”, analisa o professor.

 

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