ARTIGO ACADÊMICO

 

Marcelo Manzano, André E. Krein e Anselmo L. dos Santos | Fiocruz

 

Entre os anos de 2015 e 2022, o Brasil foi palco de uma sucessão de crises de alta intensidade que afetaram profundamente o tecido econômico, político e social do país. Depois de uma queda de cerca de 7% do PIB entre 2015 e 2016, seguiu-se uma claudicante retomada da atividade econômica, perfazendo o mais longo ciclo de recuperação pós-recessão já registrado na turbulenta história econômica do país. Como resultado, o setor industrial, que já vinha perdendo densidade desde o final da década de 1980, caiu para cerca de 10% do PIB (pior resultado desde o início da série em 1947), e o mercado de trabalho se desestruturou rapidamente, alcançando taxas de desemprego aberto permanentemente acima dos 10%, com mais da metade dos trabalhadores sem vínculos formais e cerca de ¼ dos ocupados atuando por conta própria.

Não parece exagero dizer que a aventura neoliberal – que teve início em 2015 e deu curso a uma sequência de reformas institucionais de caráter regressivo e conservador – revela-se como uma inflexão da estrutura produtiva e social do país, fruto não de um incidente ou exclusivamente de choques exógenos, mas de um conjunto sistemático de políticas de inspiração ortodoxa cujo objetivo era desconstruir o Estado Social brasileiro, o qual, a duras penas e de forma ainda incompleta, vinha sendo erigido desde a Constituição de 1988.

Diante desse quadro de larga regressão, fica cada vez mais claro entre diferentes segmentos da sociedade brasileira que a necessária reconstrução da nação e a retomada de um programa de desenvolvimento sustentável passará obrigatoriamente pela reconstituição do tecido econômico, notadamente por meio de um conjunto de estratégias que coloquem em curso um processo de reindustrialização do país.

Entretanto, por uma série de razões,3 a tarefa será hercúlea e exigirá um grande esforço de coordenação política, de planejamento e de articulação entre atores institucionais, sociais e empresariais em torno de alguns poucos setores econômicos chave, os quais devem reunir, ao menos, os seguintes atributos: (1) boas condições de competitividade para enfrentar a concorrência internacional; (2) capacidade de geração de postos de trabalho de qualidade em grande quantidade; (3) potencial para induzir o desenvolvimento científico e tecnológico nacional – notadamente das tecnologias da Indústria 4.0; (4) capacidade para auxiliar a reverter as desigualdades regionais; e (5) parâmetros produtivos convergentes às metas de transição ecológica e de reconversão da economia brasileira a um padrão de baixo carbono.

Infelizmente, ao observador atento à realidade brasileira neste início da terceira década do século XXI, restará claro que são poucos os setores de atividade econômica que reúnem aqueles atributos e que, portanto, poderiam ser alçados à condição de plataforma para o processo de reindustrialização do país. Frente à flagrante escassez de alternativas, o Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS) desponta como “pule de dez”, como o mais evidente e certamente o mais meritório e promissor setor de atividade a ser abraçado por um novo ciclo de desenvolvimento nacional, quiçá agora não apenas pautado pelas métricas econômicas, mas sobretudo pelas possibilidades de progresso social e cultural, tal como conceituava e pelo que combatia Celso Furtado.

 

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