MÍDIA

Ricardo Carneiro | Le Monde Diplomatique

O lançamento, pelo FMI, do Global Financial Stability Report, em outubro de 2019, despertou pouca discussão na imprensa e nos mercados, a despeito do seu sugestivo título: “Lower for longer”. No documento, o fundo defende a tese de que as taxas de juros nos países avançados e sobretudo nos Estados Unidos, foram mantidas baixas durante um tempo excessivo, e reafirmadas no início de 2019, conduzindo a formação de várias fragilidades nos sistemas financeiros domésticos e globais. Os eventos recentes, que podem caracterizar uma crise financeira de grande intensidade e disseminação, aos quais se atribui uma responsabilidade exclusiva da epidemia do coronavírus, só podem ser compreendidos se considerados à luz desta bolha que inflava, pelo menos, desde 2010.

Mesmo que se possa discordar da ênfase excessiva do FMI nas questões de curto prazo, como na trajetória da taxa de juros, omitindo por exemplo, o significado da desregulação dos mercados financeiros e em particular a sua crescente liquidez, certamente, a trajetória das taxas de juros é um ingrediente relevante da formação das bolhas. Ademais, independentemente do grau de completude do diagnóstico do FMI, várias dimensões relevantes estão exaustivamente consideradas. Como pano de fundo, a inflação de preços dos ativos, o excesso de endividamento e alavancagem dos vários agentes, mercados e países, sem a contrapartida dos fluxos de renda capazes de dar suporte ao processo de valorização.

Ao deixar de lado um período mais longo, o FMI omite-se de mencionar que a atual bolha remonta o imediato pós-crise financeira e está indissociavelmente ligada à política monetária não convencional praticada pelos bancos centrais dos países desenvolvidos, o denominado Quantitative Easing, que inundou os mercados de liquidez ou, mais precisamente, de moeda, emitida pelos bancos centrais, inicialmente em troca de títulos podres das carteiras dos bancos e, posteriormente, para adquirir títulos públicos, como forma de manter sob controle a taxa de juros de médio e longo prazos. Isso deu origem, por parte do setor financeiro ao financiamento e compra de ativos no amplo espectro de maturidades, moedas e riscos, configurando o que o The Economist denominou de “a bull market in everything” ou o que várias correntes de economistas passaram a denominar de a “bolha dos bancos centrais”. Tudo isso, a despeito de que a atividade econômica reagiu com muito menos intensidade.

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As opiniões expressas no artigo são de responsabilidade pessoal do autor.

* Ricardo Carneiro é professor titular do Instituto de Economia da Unicamp e ex-diretor executivo do Brasil no BID.